Após meses de tensão interna, críticas públicas e pressão regulatória, a OpenAI decide manter o controle sob sua fundação não-lucrativa e adotar estrutura de benefício público.
Por Alan Menezes | Especialista em Tecnologia e Segurança da Informação
A OpenAI, organização responsável pelo ChatGPT e um dos nomes mais influentes na corrida pela inteligência artificial geral (AGI), anunciou nesta segunda-feira (6) que não seguirá mais com os planos de se tornar uma empresa puramente lucrativa. A decisão marca uma reviravolta estratégica e vem em resposta à crescente pressão de entidades civis, ex-funcionários e autoridades regulatórias dos Estados Unidos.
O recuo foi oficializado em uma postagem no blog da empresa e numa carta assinada por Sam Altman, CEO e cofundador da OpenAI. “A OpenAI não é uma companhia normal e nunca será. Nossa missão é garantir que a IA geral beneficie toda a humanidade”, declarou Altman, sinalizando que a essência da organização — ao menos em discurso — segue inalterada.
Um plano polêmico desde o início
Desde setembro de 2024, rumores sobre a conversão da OpenAI em uma empresa com fins lucrativos ganhavam força, culminando em negociações com grandes investidores como Microsoft e SoftBank. O modelo proposto tiraria da fundação sem fins lucrativos o papel de controle da organização, transferindo o poder decisório para uma estrutura orientada por capital e retorno financeiro.
A ideia previa que a unidade original da OpenAI, fundada com missão ética, passasse a atuar apenas como braço de caridade, focada em áreas como saúde, ciência e educação — enquanto o núcleo lucrativo comandaria o desenvolvimento e comercialização de tecnologias de IA.
A repercussão, no entanto, foi majoritariamente negativa. Advogados, ex-executivos da empresa e especialistas em ética digital alertaram para os riscos regulatórios e morais de uma IA poderosa nas mãos de uma estrutura 100% voltada ao lucro.
Além disso, a iniciativa enfrentou desafios jurídicos consideráveis, especialmente sobre como redesenhar o papel da divisão original sem comprometer os princípios fundacionais da empresa. O processo ainda foi minado por uma ação judicial movida por Elon Musk, um dos cofundadores da OpenAI e hoje um dos seus principais críticos.
Novo modelo: entre o lucro e o propósito
A alternativa encontrada pela OpenAI foi adotar uma estrutura híbrida, que busca equilibrar os interesses de capital com os valores originais da organização. A partir de agora, a companhia seguirá os moldes de uma Public Benefit Corporation (PBC), ou corporação de benefício público — estrutura jurídica que permite lucros, mas impõe objetivos sociais no centro da operação.
Na prática:
- A fundação sem fins lucrativos continuará como controladora da OpenAI;
- A divisão comercial será convertida em PBC, mantendo a possibilidade de captar investimentos, mas com obrigações legais voltadas ao bem-estar público;
- Investidores, funcionários e instituições parceiras terão participação acionária balanceada entre retorno e impacto social.
O movimento se assemelha a estratégias adotadas por concorrentes como a Anthropic e a x.AI, que também optaram por modelos mistos frente aos desafios regulatórios e éticos da inteligência artificial em larga escala.
Reflexo de uma pressão global
A decisão da OpenAI não ocorre no vácuo. Ela é o reflexo de um ambiente global cada vez mais crítico e regulado no que diz respeito à IA. Governos discutem legislações emergenciais, e a sociedade civil acompanha com desconfiança qualquer passo que sugira a privatização do poder computacional e cognitivo em escala global.
No centro dessa discussão está a promessa — e o risco — da chamada AGI, a inteligência artificial capaz de executar qualquer tarefa cognitiva humana. Em um mundo onde algoritmos aprendem, julgam e, cada vez mais, decidem, o controle e a motivação por trás dessas decisões se tornam questões de interesse público.
A permanência da OpenAI sob comando de uma entidade não-lucrativa é uma tentativa de apaziguar essa preocupação. Mas também é um sinal claro de que o futuro da IA não será moldado apenas por engenheiros e investidores — será debatido nas cortes, nas universidades e nas ruas.
Fontes: